
Como me tornei freira, 1993
César Aira
Argentina
Por que a escolha?
Um dos romances mais conhecidos do argentino César Aira (1949) intitula-se Como me tornei freira, mas sabe-se que o título é um ardil, pois esse relato desmedido narra tudo menos a história de alguém tomando o hábito. A literatura de Aira, principalmente em seus primeiros livros, defende o jogo intenso, o surrealismo, a associação livre e a subversão formal, por isso é difícil imaginar que ao decidir que a voz do romance seria a de um menino que se refere a si mesmo no singular feminino, como uma menina chamada César Aira, o autor tenha querido propor uma história que abordasse explicitamente o “tema” da identidade de gênero, porém também não se pode afirmar o contrário. A história é construída a partir de uma metonímia: a crise de identidade como crise de representação, como a impossibilidade de representar (a si mesma) como qualquer coisa medianamente verossímil. A menina César Aira se confessa sempre como mentirosa compulsiva, como enganadora e artífice de ficções. Assim, o romance discorre pelas lindes do deliberadamente inexplicável.
Na leitura, a subversão formal do gênero é oferecida como uma experiência limite da crise de identidade e atinge uma dimensão universal, radicalmente humana.
Ficha técnica