Por que a escolha?

Porque A parte dos crimes é o relato comovente de uma das experiências de violência mais brutais de todos os tempos e lugares contra mulheres. Nesta quarta parte de 2666, Roberto Bolaño (1953-2003) escreve um romance sobre os crimes cometidosA parte dos crimes contra mulheres em Ciudad Juárez, México, na década de 1990.

Um relato minucioso, como o de um arquivo policial, se detém no espaço em que um corpo é encontrado, nas cores e na textura da roupa, no comprimento do cabelo e no que havia em uma bolsa. Depois, esta fria enumeração é completada com detalhes que devolvem à vítima sua humanidade e à história, sua poesia. A roupa que ela estava usando, que dividia com a filha, como tantas outras coisas; o cabelo comprido até a cintura que, diz a irmã, ela estava pensando em cortar; o corpo que ninguém reclama, como se essa mulher tivesse sido invisível até o momento em que o assassino prestou atenção nela para matá-la.

Cento e dez vezes Bolaño narra a descoberta de um corpo, as circunstâncias que a envolvem, ou as características físicas da mulher assasinada. E faz isso com uma aplicação e uma insistência que não implicam reiteração e uniformidade. Por outro lado, a indolência e o descaramento daqueles que têm em seu poder prevenir, investigar e sancionar são permanentes, repetidas e idênticas.